Aspectos Inusitados da Vida de Einstein

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 Por José Maria Filardo Bassalo.


O físico alemão Albert Einstein nasceu em Ulm, no antigo estado alemão de Wüttemberg, sexta-feira, dia 14 de março de 1879, na rua Bahnhofstrasse, 20, segundo seu registro de nascimento. Seus pais chamavam-se Hermann (1847-1902) e Pauline Koch (1858-1920), que era excelente pianista. Ele teve uma irmã de nome Maja (Maria) (1881-1951). Seu pai e seu tio paterno Jakob (1950-1912), engenheiro mecânico, eram donos de uma oficina eletrotécnica. Aliás, era esse tio que lhe emprestava livros com problemas engenhosos de Álgebra, e que ficava muito eufórico quando seu sobrinho os resolvia. Em 1880, seus pais mudaram-se para Munique.
Einstein com 3 anos de idade em 1882
Einstein só começou a falar com a idade de três anos e, quando começou a falar, tinha o hábito de ensaiar mentalmente o que ia dizer, mexendo os lábios, e só depois repetia a frase em voz alta. Por causa disso, a empregada da família apelidou-o de “burro”. Com a idade de sete anos Einstein entrou na Volksschule, uma escola pública católica, sendo o único judeu, entre 70 alunos. Em outubro de 1888, matriculou-se no Luitpold Gymnasium, no qual, segundo seus biógrafos, desenvolveu um senso crítico às autoridades, bem como procurou ser sempre livre e independente. Esses aspectos de sua personalidade levaram seu professor de Grego, Joseph Degenhart, que foi um de seus ordinarius – professor responsável pelas tarefas escolares -, a dizer que Einstein não conseguiria ser nada na vida e que ficaria muito feliz se ele não assistisse mais suas aulas. Por outro lado, seu primeiro ordinarius, o professor de Latim e Alemão, Ferdinand Ruess, foi quem o introduziu nas leituras dos dramaturgos, o inglês William Shakespeare (1564-1616) e o alemão Johann Wolfgang von Goethe (1749-1832). É interessante registrar que, nesse Ginásio, Einstein teve como professores de Física e de Matemática, respectivamente, Joseph Ducrue e Adolf Sickenburger.

Em outubro de 1895, com dois anos menos do mínimo permitido, Einstein prestou exame de admissão para a Polytechnikum, em Zurique, na Suíça, a famosa escola técnica, fundada em 1855 e que, em 1911, passou a ser chamada de Eidgenössische Technische Hochschule (ETH, “Escola Politécnica Federal”). Einstein foi aceito para fazer esses exames devido a alta recomendação de Sickenburger, seu professor de Matemática em Munique. Ele foi examinado em temas científicos (Matemática, Física, Biologia e Química), e em temas gerais (Literatura, História Política, Alemão e Francês), e foi reprovado em Biologia, Química e Francês. Ele pretendia ser engenheiro eletricista. Por recomendação do Diretor da ETH, professor Albin Hertzog, Einstein entrou na Kantonsschule (“Escola Cantonal”) de Aarau, que era capital do cantão de Aargau, ainda na Suíça, em outubro de 1895, para completar sua educação secundária, uma vez que tinha abandonado (alguns de seus biógrafos afirmam que ele foi expulso) o Luitpold Gymnasium. Em Aarau, Einstein morou na casa do professor Jost Winteler (1846-1929) a quem ele se afeiçoou a ponto de considerá-lo um segundo pai. Embora Winteler fosse professor da “Escola Cantonal”, ele não foi professor de Einstein. Nessa Escola de Aarau, Einstein teve aulas de Física com August Tuchsmidt, de Matemática com Heinrich Ganter, e de Química, Geografia Física e História Natural com Friedrich Muehlberg. Em setembro de 1896 ele voltou a fazer o exame de admissão na ETH, desta vez foi aprovado com notas máximas em Matemática, Física, Canto e Violino, porém não foi bem em Francês. Ele matriculou-se no Departamento VI (Escola para Professores Especializados em Matemática e Assuntos Científicos) da ETH, na Seção VI-A: Matemática, Física e Astronomia.

Como aluno da ETH, Einstein voltou a manifestar seu senso de liberdade e independência. Com efeito, certa vez, Einstein jogou no lixo o Manual de Laboratório de Física preparado pelo professor Johannes Pernet (1845–1902), catedrático de Física Experimental. Ao ver essa atitude de Einstein, Pernet reagiu dizendo-lhe: Você tem entusiasmo, mas não tem talento em Física. Para o seu bem, deveria fazer outra coisa, Medicina talvez, Literatura ou Direito. Einstein respondeu-lhe com as seguintes palavras: 
Porque, senhor professor, eu tenho ainda menos talento para esses assuntos. Por que não deveria, ao menos, tentar a minha sorte com a Física? 
Por outro lado, como Einstein faltava com freqüência as aulas de Pernet e realizava as práticas de laboratório de maneira independente sem ouvir suas instruções, esse professor deu-lhe a nota mínima 1, apesar de seu assistente haver-lhe dito que, embora heterodoxas, as soluções de Einstein sempre eram corretas. De outra feita, como Einstein manifestara desprezo pela autoridade de seu professor, o físico alemão Heinrich Friedrich Weber (1843-1912), catedrático de Física-Matemática e Técnica, ouviu deste a seguinte afirmação: 
Você é um rapaz inteligente, Einstein, um rapaz muito inteligente; mas tem um grande defeito: não ouve o que os outros dizem. 
Hermann Minkowski em 1909
É ainda interessante registrar que o grande matemático russo-alemão Hermann Minkowski (1864-1909) (quem, mais tarde, chamaria a atenção de Einstein para o Cálculo Tensorial, importante assunto matemático que lhe permitiu desenvolver a Teoria da Relatividade Geral, em 1915), professor de várias disciplinas de Matemática na ETH, chegou a chamar Einstein de “cão preguiçoso” por causa das constantes ausências em suas aulas. Registre-se que Einstein formou-se em Física em 27 de julho de 1900, com as seguintes notas (para um máximo de 6 e um mínimo de 1) em seu exame final: Física Experimental – 5 (peso 2); Física Teórica – 5 (peso 2); Astronomia- 5 (peso 1); Teoria das Funções – 5,5 (peso 2); Tese de Graduação – 4,5 (peso 4); Nota Final – 54 pontos. O primeiro lugar foi de Louis Kollros (1878-1959), com 60 pontos; o segundo lugar foi o do seu grande amigo, o matemático Marcel Grossmann (1878-1936), nascido em Budapeste, com 57,5 pontos; o terceiro foi de Jakob Ehrat (1876-1960), com 56,5 pontos. Einstein foi o quarto. Aliás, era Grossmann quem emprestava as notas das aulas para Einstein pois, insatisfeito com seus professores que não lhe ensinarem assuntos mais modernos, como, por exemplo, ocorria com Weber que não ensinava a Teoria Eletromagnética Maxwelliana, nas diversas disciplinas que ensinava (ver a relação delas no citado livro dos Medeiros), Einstein faltava às aulas para estudar aqueles assuntos. Registre-se que, em 21 de fevereiro de 1901, Einstein se tornou cidadão suíço.

Mileva Maric em 1896
Foi na ETH que Einstein se apaixonou por sua colega de turma, Mileva Maric (1875-1948), nascida de pais católicos na cidade de Titel, em Vojvodina, então na Hungria. (Aliás, Mileva foi reprovada no exame final que fez junto com Einstein, pois conseguiu apenas 44 pontos.) Em 1901, tiveram uma filha de nome Liesl (apelidada de Lieserl, que significa pequena Liesl), cujas referências a ela, por parte de Einstein e Mileva, terminaram em setembro de 1903. Não se sabe ao certo se essa criança faleceu ou se foi adotada por essa época. Einstein e Mileva casaram-se no dia 06 de janeiro de 1903, e desse casamento, nasceram os filhos Hans Albert (1904-1973), engenheiro civil pela ETH, professor de Engenharia Hidráulica na Universidade da Califórnia, em Berkeley, e na Universidade de Iowa, e construtor das mais importantes barragens no mundo todo, e Eduard (1910-1965), que era muito talentoso para as artes, estudou psiquiatria na Universidade de Zurique e morreu confinado em um Hospital Psiquiátrico, em Burghölzli, na Suíça.

Em junho de 1914, Einstein se separou de Mileva e se divorciaram em 14 de fevereiro de 1919. Ainda em 1919, no dia 02 de junho, Einstein casou-se com sua prima, também divorciada, Elsa Einstein Löwenthal (1876-1936).

Retrato oficial de Einstein em 1921
depois de receber o Prêmio Nobel de Física.
Em 09 de novembro de 1922, recebeu o Prêmio Nobel de Física de 1921, pela descoberta da lei do efeito fotoelétrico e por trabalhos em Física Teórica. O valor desse Prêmio, cerca de 32.000 dólares, Einstein transferiu para Mileva, em 1923. Ele tornou-se cidadão norte-americano, em 01 de outubro de 1940, conservando, no entanto, seu passaporte suíço. Einstein morreu a uma hora e quinze minutos da manhã de 18 de abril de 1955, segunda-feira, de ataque cardíaco, no Princeton Hospital, com a assistência da enfermeira Alberta Rozsel. Ele foi cremado no Ewing Crematorium, em Trenton, quatro horas da tarde desse mesmo dia 18, e suas cinzas foram espalhadas pelo economista germano-norte-americano Otto Nathan (1893-1987) e pelo químico, filósofo e industrial alemão Paul Oppenheim (1885-1977) nas proximidades do crematório e em lugar não revelado.

Enquanto estudava na ETH, Einstein completava a pequena mesada que ganhava de uma tia materna dando aulas particulares de Física e de Matemática e, por pouco tempo (16 de maio-11 de julho de 1901), ensinou Matemática na Escola Técnica de Winterthur, substituindo o professor Jakob Rebstein (1845-1933), que o indicou pois o conhecia quando o ensinou na ETH e, entre outubro de 1901 e janeiro de 1902, foi professor no Internato de Schaffhausen. Preocupado com essa situação financeira de Einstein, Marcel Grossmann falou ao seu pai para arranjar um emprego para seu amigo Albert. Desse modo, o pai de Marcel conversou com seu amigo, o engenheiro mecânico suíço Friedrich Haller (1844-1936), Diretor do Escritório (“Bureau”) de Patentes, em Berna, para arranjar um emprego para Einstein. Registre-se que, em dezembro de 1901, esse “Bureau” abrira uma vaga de engenheiro de segunda classe para seu quadro de empregados e Einstein havia se candidatado para ocupar tal vaga. Depois de ouvir Einstein por cerca de duas horas, Haller percebeu que o amigo de Marcel não tinha muita habilidade técnica, porém, tinha um profundo conhecimento da Teoria Eletromagnética Maxwelliana, que aprendera sozinho, pois ela não fazia parte do ensino que recebera na ETH. Em vista disso, ofereceu-lhe o emprego de perito-técnico de terceira classe. Einstein foi admitido no dia 16 de junho de 1902, e começou a trabalhar no dia 23 desse mesmo mês. Ele trabalhou nesse “Bureau” até julho de 1909 onde, segundo Infeld (ver livro citado), ele estudava pouco, mas meditava muito.

Enquanto estava em Berna e antes de trabalhar no Escritório de Patentes, Einstein se mantinha dando aulas particulares de Física, anunciadas em um jornal local, com os dizeres: Albert Einstein, antigo aluno da Escola Politécnica de Zurique, dá aulas de Física, por três francos por hora. Um dos primeiros alunos de Einstein foi o jovem arquiteto romeno Maurice Solovine (1875-1958), estudante de filosofia e literatura na Universidade de Berna, que leu esse anúncio, na Páscoa de 1902, e se dirigiu ao primeiro andar da rua Gerechtigkeitsgasse, 32, onde morava Einstein. No primeiro encontro, conversaram durante duas horas, sobre vários assuntos, e acertaram aulas diárias de Física. No terceiro dia, Einstein desistiu de ser professor particular de Solovine, e lhe falou: Você não precisa de aulas de Física; nossa discussão de problemas originados na Física é muito mais interessante. Continue vindo me ver e terei o maior prazer em conversar com você. Semanas depois, um terceiro personagem passou a fazer parte dessa discussão, seu amigo e ex-colega da ETH, com domicílio em Schaffhausen, o engenheiro alemão Conrad Habicht (1876-1958), que realizava o Doutorado de Matemática na Universidade de Berna. Assim, ainda em 1902, os três fundaram a Akademie Olympia, que funcionava em cafés da cidade, cervejarias, recitais de música e em caminhadas nos fins de semana. Depois do casamento de Einstein e Mileva, no começo de 1903, conforme já registramos (cujos padrinhos foram Solovine e Conrad), as reuniões também se realizavam no pequeno apartamento dos Einstein, na rua Kramgasse, 49. Durante essas reuniões, ocasionalmente, Einstein tocava violino, que aprendera a tocar desde os seis anos de idade por indicação de sua mãe.

Da esquerda para a direita:
Conrad Habicht, 
Maurice Solovine e Einstein,
fundadores da Akademie Olympia
Na Akademie, os “três mosquiteiros intelectuais” estudaram os trabalhos de Física e Matemática de Karl Pearson (1857-1936) (matemático inglês), Ernst Mach (1838-1916) (físico e filósofo austríaco), Hermann Ludwig Ferdinand von Helmholtz (1821-1894) (físico e fisiologista alemão), André Marie Ampère (1775-1836) (físico e matemático francês), Georg Friedrich Bernhard Riemann (1826-1866) (matemático alemão) e Jules Henri Poincaré (1854-1912) (físico, matemático e filósofo francês). Deste, estudaram também seu famoso livro La Science et l´Hypothese, publicado em 1905. Além disso, discutiram as idéias de Platão (c.427-c.347) (filósofo grego), Benedict Baruch de Spinoza (1632-1677) (filósofo holandês), David Hume (1711-1776) (filósofo escocês), John Stuart Mill (1806-1873) (filósofo inglês), Richard Heinrich Ludwig Avenarius (1843-1896) (filósofo alemão) e de outros filósofos, entremeadas com leituras da literatura clássica de Sófocles (496-406) (dramaturgo grego), Miguel de Cervantes Saavedra (1547-1616) (novelista espanhol), Jean-Baptiste Racine (1639-1699) (poeta francês) e Charles John Huffam Dickens (1812-1870) (novelista inglês). Note-se que, por essa época, Einstein tinha também um grande amigo (e que permaneceu seu amigo até morrer, um pouco mais de um mês antes da morte de Einstein), o engenheiro mecânico ítalo-suíço Michelangelo Besso (1873-1955) que, apesar de não ser “acadêmico”, foi quem chamou a atenção de Einstein para os trabalhos de Mach. Aliás, foi Einstein quem levou Besso a trabalhar no Registro de Patentes, em 1904. É oportuno registrar que Einstein dedicou a Besso seu famoso trabalho de 1905, intitulado Elektrodynamik bewegter Körper (“Eletrodinâmica dos Corpos em Movimento”), publicado no Annalen der Physik 17, p. 891, mais tarde conhecido como a Teoria da Relatividade Restrita.

O início do questionamento científico de Einstein ocorreu em 1894 ou 1895, quando escreveu um artigo intitulado Über die Untersuchung des Ätherzustandes in magnitischen Fielde (“Sobre a Pesquisa do Estado do Éter em um Campo Magnético”), com apenas cinco páginas, no qual, ele, com apenas 16 anos, propunha uma experiência para estudar o comportamento do éter em um campo magnético. Esse trabalho foi enviado de Pavia, onde morava, para seu tio materno Caesar Koch (1854-1941), na Bélgica, junto com uma carta na qual ele falava na sua vontade de estudar na ETH. Note-se que, quando criança, Einstein recebeu desse seu tio uma pequena máquina a vapor, que o fazia esquecer da vida enquanto brincava com ela. [Registre-se que o artigo e a carta referidos acima foram reproduzidos pelo físico e filósofo da ciência indiano-norte-americano Jadish Mehra (n.1931), em 1971 (Physikalische Blätter 27, p. 385).] Foi ainda por volta de 1895 que Einstein questionou as conseqüências físicas de uma pessoa que se deslocasse com a velocidade da luz. Como se vê, desde cedo Einstein já apresentava questões altamente interessantes e de grande conteúdo científico investigatório. Certamente esse espírito questionador começou quando ele tinha cerca de quatro anos de idade ao examinar, com curiosidade, uma bússola que o pai lhe mostrou.

Considerando que uma carreira científica está diretamente vinculada à publicação de artigos em revistas especializadas, pode-se dizer que a de Einstein teve início em 1901, com a publicação do artigo Folgerungen aus den Kapillaritäserscheinungen (“Deduções dos Fenômenos de Capilaridade”) no Annalen der Physik 4, p. 513. É oportuno notar que esse artigo foi escrito quando ele ensinava na Escola Técnica de Winterhur. Ele teve a inspiração para escrever esse depois de ouvir uma aula teórica, sobre capilaridade, que Minkowski ministrou em 1900. Essa aula o impressionou tanto que Einstein chegou a dizer ao seu colega Kollros que ela teria sido a primeira aula verdadeiramente de Física-Matemática que havia assistido na ETH.

Ainda em 1901, em novembro, Einstein submeteu à Universidade de Zurique (UZ) (pois, por essa época, a ETH ainda não oferecia o Doutoramento) sua Tese de Doutoramento, intitulada Eine Neue Bestimund der Moleküldimension (“Uma Nova Fixação Dimensional das Moléculas”), elaborada sem nenhuma assistência de qualquer professor. Vejamos a razão dessa atitude de Einstein. Na tentativa de obter um emprego de professor assistente em alguma universidade européia fora de Zurique, uma vez que fora recusado a ser assistente de algum professor da ETH, Einstein enviou copias de seu primeiro artigo publicado para professores famosos, como o físico austríaco Ludwig Edward Boltzmann (1844-1906), da Universidade de Leipzig, o físico alemão Wilhelm Carl Werner Otto Fritz Franz Wien (1864-1928; PNF, 1911), da Universidade de Breslau, e o físico-químico alemão Friedrich Wilhelm Ostwald (1853-1932; PNQ, 1909), da Universidade de Leipzig. Este, sem Einstein saber, também recebeu uma carta de seu pai Hermann solicitando emprego ao filho. Einstein escreveu também para os físicos, o holandês Heike Karmelingh Onnes (1853-1926; PNF, 1913), da Universidade de Leiden, o italiano Augusto Righi (1850-1920), da Universidade de Bolonha, e o alemão Carl Adolph Paalzow, da Universidade de Berlim. Einstein não recebeu nenhuma resposta desses eminentes professores. Em vista dessas recusas, Einstein resolveu obter seu Doutoramento, pois soube que o físico alemão Carl Victor Eduard Riecke (1845-1915), da Universidade de Goettingen, precisava de dois assistentes-doutores. É oportuno registrar que Ostwald indicou o nome de Einstein para receber o PNF nos anos de 1909, 1910, 1913 e 1914.

Einstein em 1904, aos 25 anos de idade.
Inicialmente Einstein sondou Weber, no inverno de 1900-1901, a ser orientador de sua Tese de Doutoramento, uma vez que ele havia sido seu orientador da Diplomarbeit (“Diploma de Graduação”). Ele pretendia desenvolver um trabalho sobre o efeito Thomson, o que foi aceito por Weber. No entanto, Einstein resolveu estender seu primeiro artigo, que tratava com as “forças moleculares”, aos gases. Weber não aceitou e, então, Einstein resolveu desenvolvê-la sozinho. (Mais detalhes da relação conflituosa entre Einstein e Weber, ver o livro dos Medeiros.) Essa Tese, que apresentava um método hidrodinâmico de determinar dimensões moleculares, foi examinada pelo físico suíço Alfred Kleiner (1849-1916) que a recusou por considerá-la muito curta, pois apresentava apenas 21 páginas, e devolveu a Einstein, em 01 fevereiro de 1902, inclusive com a taxa de inscrição: 230 francos suíços. Depois de refazê-la, em 30 de abril de 1905 e dedicá-la ao amigo Marcel Grossmann, ele voltou a apresentá-la em 20 de julho de 1905 à UZ, acrescida apenas de mais uma sentença, conforme Einstein comentou, às gargalhadas, anos mais tarde. Ela foi então imediatamente aprovada por Kleiner e pelo físico suíço Heinrich Burkhardt (1861-1914) quem, inclusive, conferiu os cálculos matemáticos nela envolvidos. É oportuno destacar que, ainda em 1905, Einstein publicou seus famosos artigos, que constituem o marco de sua celebridade: Efeito Fotoelétrico (Annalen der Physik 17, p. 132), Movimento Browniano (Annalen der Physik 17, p. 549), e Relatividade Restrita, já referido. O artigo sobre o Movimento Browniano apresenta resultados que são subprodutos de sua Tese de Doutoramento. Para uma análise crítica dessa Tese, ver o citado livro de Stachel.

Sobre essa Tese (publicada em 1906, no Annalen der Physik 19, p. 289, sem a dedicatória a Grossmann), há fatos inusitados a comentar. Independentemente de Einstein, o físico australiano William Sutherland (1859-1911) encontrou, em 1905 (Philosophical Magazine 9, p. 781), o mesmo resultado encontrado por Einstein para o coeficiente de difusão D de um soluto, resultado esse que depende do número de Avogadro $N$. Ainda em sua Tese, Einstein deduziu uma expressão para o coeficiente de viscosidade de um líquido com ($k^*$) e sem ($k$) moléculas em suspensão: $k^* = k(1 + f)$, onde $f$ representa a fração do volume ocupado pelas moléculas solutas. Em 1909 (Annales de Chimie et Physique 18, p. 1), o físico francês Jean Baptiste Perrin (1870-1942; PNF, 1926) determinou $N$ e encontrou um valor diferente da fórmula de Sutherland-Einstein. Em 1910, Jacques Bancelin, aluno de Perrin, realizou um estudo experimental sobre os coeficientes de viscosidade dados pela expressão acima, e encontrou que $f$ deveria ser multiplicado pelo fator $3,9$, a não o valor $1$ como indicava a referida expressão.

Ao receber de Bancelin essa informação, Einstein passou a rever seus cálculos. Como não encontrou nenhum erro, escreveu a seu aluno Ludwig Hopf (1884-1939), em janeiro de 1911, dizendo-lhe: Você faria um grande favor se refizesse cuidadosamente minha investigação. Ou há um erro no trabalho, ou o volume da substância em suspensão de Perrin, no estado de suspensão, é maior do que ele acredita. Hopf refez os cálculos e mostrou que Einstein havia errado nas derivadas dos componentes das velocidades nas equações para os componentes de pressão. Após a correção do erro, Hopf encontrou que o fator multiplicativo de $f$ seria $2,5$, e não o $3,9$ de Bancelin. Em 1911 (Annalen der Physik 34, p. 591), Einstein publicou um trabalho no qual corrigiu sua fórmula, introduzindo o valor calculado por Hopf. É oportuno registrar que, em maio de 1911, Bancelin apresentou à Academia Francesa de Ciências os resultados de novas experiências sobre a medida da viscosidade, nos quais apresentava o valor $2,9$ como coeficiente de $f$ na expressão de Einstein-Hopf. É curioso como Burkhardt, que conferiu os cálculos matemáticos da Tese de Einstein conforme relatamos acima, não tenha percebido esse erro.

Durante toda a vida científica, Einstein escreveu mais de 300 artigos (ver relação no livro do Schilpp), a grande maioria deles escritos em alemão e apenas ele como autor. Desses 300 artigos, apenas 44 foram escritos com colaboradores, que foram os seguintes físicos (o número entre parêntesis indica o número de artigos): Johann Jakob Laub (1872-1962) (2); Hopf (2); Otto Stern (1888-1969; PNF, 1943) (1); Adriaan Daniel Fokker (1887-1968) (1); Grossmann (1); Wander Johannes de Haas (1878-1960) (4); Hans Mühsam (1876-1957) (1); Jakob Grommer (1879-1933) (2); Paul Ehrenfest (1880-1933) (1); Théophile de Donder (1872-1957) (1); Walther Mayer (1887-1948) (8); Richard Chase Tolman (1881-1948) (1); Boris Podolsky (1896-1966) (2); Willem de Sitter (1872-1974) (1); Nathan Rosen (1909-1995) (4); Leopold Infeld (1898-1968) (4); Banesh Hoffmann (1906-1986) (1); Peter Gabriel Bergmann (1915-2002) (2); Valentin Bargmann (1908-1989) (2); Wolfgang Pauli Jr. (1900-1958; PNF, 1945) (1); e Ernst Gabor Straus (1922-1983) (2).

Einstein em 1947
Muito embora, ao morrer em 1955 Einstein estivesse trabalhando na Teoria do Campo Unificado [cujo primeiro trabalho sobre esse tema, qual seja, a unificação entre as forças eletromagnética e gravitacional, ele o publicou em 1925 (Preussische Akademie der Wissenschaften zu Berlin, Mathematisch-physikalische Klasse, Sitzungsberichte, p. 414)], o seu último artigo científico foi publicado em 1949 (Canadian Journal of Mathematics 3, p. 209) e escrito em colaboração com Infeld, com o seguinte título: Motion of Particles in General Relativity Theory. É oportuno registrar que durante a carreira científica de Einstein, ninguém jamais obteve o grau de Doutor em Física sob a sua orientação, muito embora haja tido alguns alunos de Doutoramento, sendo Hans Tanner (1886- ? ), o primeiro deles quando Einstein ensinava na Universidade de Zurique, na qual lecionou entre outubro de 1909 e abril de 1911.




Na conclusão desse verbete sobre alguns aspectos inusitados da vida de Einstein, relataremos mais dois deles. O primeiro se relaciona com a sua religião; o segundo, com a sua famosa foto com a língua de fora. Vejamos a sua religião. É muito difícil resumir em poucas palavras o que Jammer, no livro referido no final deste verbete, escreveu sobre a religião de Einstein. Por isso, escolhi apenas duas frases suas que, para mim, sintetizam o pensamento Einsteiniano sobre a Religião. A primeira delas é o resumo que fez de sua Filosofia da Religião: A Ciência sem Religião é manca, a Religião sem Ciência é cega. A segunda frase, ele a proferiu quando o Rabino Herbert S. Goldstein, da Sinagoga Institucional de Nova York, lhe telegrafou perguntando: O senhor acredita em DEUS?. Recebeu dele a seguinte resposta: Acredito no DEUS de Spinoza, que se revela na harmonia de todos os seres, não no DEUS que se interessa pela sorte e ação dos homens. Esse telegrama do Rabino Goldstein foi motivado por uma recomendação feita, em abril de 1929, pelo Cardeal O´Connell, Arcebispo de Boston, e destinada aos membros do Clube Católico Americano de Nova Inglaterra: Não leiam a Teoria da Relatividade Einsteniana, porque ela é uma especulação confusa, que produz a dúvida universal sobre Deus e Sua Criação; ela encobre a assustadora aparição do ateísmo.

Agora, vejamos como ocorreu a fotografia com a língua de fora. No livro de Andrew Robson, referido no final deste verbete, aparece essa famosa foto de Einstein, tirada pelo fotógrafo Arthur Sasse, no dia 14 de abril de 1951, quando ele completava 72 anos de idade. Ele se encontrava no interior de um automóvel, e se dirigia para a solenidade de entrega do primeiro Einstein Awards for Achievements in Natural Sciences (“Prêmio Einstein para Feitos nas Ciências Naturais”). Essa atitude de Einstein foi a resposta ao seguinte pedido de Sasse: Um sorriso para vosso aniversário, professor.

Segundo contou-me meu amigo, o físico brasileiro Jayme Tiomno (n.1920), essa não foi a única oportunidade que Einstein teve para colocar a língua de fora. Quando Tiomno fazia seu Doutoramento na Universidade de Princeton, no começo da década de 1950, em uma conferência proferida por Einstein, que então trabalhava no Instituto de Estudos Avançados de Princeton, ele pediu aos ouvintes que tentassem conter a Guerra Fria - corrida armamentista entre os Estados Unidos e a então União Soviética, ocorrida em seu período mais crítico, entre 1949 e 1953. Seu pedido era no sentido de os ouvintes mandarem cartas para os principais mandatários desses países para pedirem o término dessa Guerra. Aí, então, ele colocou a língua de fora oferecendo saliva para colar os selos das cartas. Não sei se houve alguma fotografia desse ato de Einstein.


Para este verbete, usei como referência, basicamente, os seguintes textos: 
  • Leopold Infeld, Albert Einstein: A sua Obra e a sua Influência no Mundo Contemporâneo (Charles Scribner´s Sons, 1950); 
  • Paul Arthur Schilpp (Editor), Albert Einstein: Philosopher-Scientist (Open Court/Cambridge University Press, 1970); 
  • Albert Einstein, Écrits Politiques (Seuil/CNRS, 1991); 
  • Abraham Pais, Subtle is the Lord... The Science and the Life of Albert Einstein (Oxford University Press, 1983); 
  • Isaías Golgher, O Universo Físico e Humano de Albert Einstein (Oficina de Livros, 1991); 
  • Michel Paty, Einstein Philosophe (Presses Universitaires de France, 1993); 
  • Abraham Pais, Einstein Lived Here (Clarendon Press e Oxford University Press, 1994); 
  • Ildeu de Castro Moreira e Antonio Augusto Passos Videira (organizadores), Einstein e o Brasil (Editora UFRJ, 1995); 
  • Max Jammer, Einstein e a Religião: Física e Teologia (Contraponto, 2000); 
  • Alfredo Tiomno Tolmasquim, Einstein: O Viajante da Relatividade na América do Sul (Vieira & Lent, 2003); 
  • John Stachel (organizador), O Ano Miraculoso de Einstein: Cinco Artigos que Mudaram a Face da Física (Editora UFRJ, 2001); 
  • Carlos Alberto dos Santos, O Plágio de Einstein (WS Editor, 2003); Thomas Levenson, Einstein em Berlim (Objetiva, 2003); 
  • Andrew Robson, Einstein: Os 100 Anos da Teoria da Relatividade (Campus/Elsevier, 2005); 
  • Stephen Hawking, Os Gênios da Ciência: Sobre os Ombros de Gigantes (Campus/Elsevier, 2005); 
  • Michio Kaku, O Cosmo de Einstein: Como a visão de Albert Einstein transformou nossa compreensão de espaço e tempo (Companhia das Letras, 2005); 
  • Alexandre Medeiros e Cleide Farias de Medeiros, Einstein e a Educação (Livraria da Física, 2006).
Texto retirado e adaptado do site: http://www.searadaciencia.ufc.br/folclore/folclore120.htm

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